Já tentou mudar um hábito e percebeu o quão desafiante isso pode ser? Seja adotar uma alimentação mais saudável, praticar exercício físico ou reduzir o tempo nas redes sociais, a sensação de lutar contra si próprio é real. Mas porque é que isso acontece? A resposta está no seu cérebro.

O cérebro e a formação dos hábitos

O nosso cérebro privilegia a eficiência. Para economizar energia, automatiza comportamentos através da formação de hábitos. Este processo ocorre principalmente nos gânglios da base, um conjunto de estruturas cerebrais responsáveis por consolidar padrões de comportamento. Quando repetimos uma ação regularmente, estas conexões tornam-se mais fortes, criando verdadeiros “atalhos neurais” que tornam os hábitos automáticos.

Neste processo, a dopamina – um neurotransmissor associado à motivação e ao prazer – desempenha um papel crucial. Quando realizamos uma ação que traz uma sensação agradável (como comer um doce ou verificar as notificações no telemóvel), o cérebro liberta dopamina, reforçando a vontade de repetir esse comportamento.

O problema é que o cérebro não distingue os hábitos benéficos dos prejudiciais. Apenas responde ao ciclo:

gatilho comportamento recompensa

Por isso, quebrar um hábito exige mais do que força de vontade. Requer uma compreensão do funcionamento do cérebro e a implementação de estratégias eficazes.

Estratégias baseadas na neurociência para mudar hábitos

Felizmente, a ciência oferece soluções para contrariar os padrões automáticos do cérebro. Aqui estão algumas abordagens sustentadas pela investigação neurocientífica:

Identifique os gatilhos e redesenhe o ciclo do hábito

Estudos sugerem que os hábitos são iniciados por gatilhos específicos, como o ambiente, a hora do dia ou um determinado estado emocional. Identificar esses gatilhos permite introduzir mudanças estratégicas. Por exemplo, se associa comer snacks pouco saudáveis a momentos de stress, pode substituir esse comportamento por outro que também promova bem-estar, como ouvir música ou praticar respiração profunda.

Aposte na substituição, não na supressão

O cérebro resiste à eliminação abrupta de um hábito, pois este já está fortemente enraizado nas suas redes neuronais. Em vez de simplesmente tentar parar, a investigação sugere que é mais eficaz substituir o comportamento por um novo hábito que ative os mesmos circuitos de recompensa. Por exemplo, se quer reduzir o consumo de café, pode trocar gradualmente por chá verde, que contém cafeína, mas em menor quantidade.

Use a plasticidade cerebral a seu favor

O cérebro é plástico, ou seja, tem a capacidade de reorganizar as suas conexões ao longo do tempo. No entanto, para fortalecer um novo hábito, é essencial a repetição consistente. O tempo necessário para transformar um hábito pode variar consoante a complexidade da ação.

Reforce o hábito com recompensas e emoções positivas

A motivação desempenha um papel essencial na criação de novos hábitos. Sempre que pratica o novo comportamento, associe-lhe uma recompensa imediata, como um elogio a si próprio ou um pequeno prazer que reforce a ação. A neurociência mostra que emoções positivas ajudam a fortalecer as conexões neurais associadas ao novo hábito, tornando-o mais sustentável a longo prazo.

Crie um ambiente que favoreça a mudança

O ambiente em que estamos inseridos tem um impacto direto nos nossos comportamentos. Estudos demonstram que pequenas alterações no contexto podem facilitar a adoção de novos hábitos. Se quer começar a treinar de manhã, por exemplo, deixar a roupa de treino à vista pode aumentar significativamente a probabilidade de cumprir esse objetivo.

Conclusão

Mudar um hábito não é apenas uma questão de força de vontade, mas sim de compreender como o cérebro funciona e aplicar estratégias eficazes para reconfigurar os circuitos neurais. Ao identificar gatilhos, utilizar a substituição inteligente, explorar a plasticidade cerebral e reforçar hábitos positivos, podemos facilitar a transformação comportamental de forma sustentável. 

O seu cérebro está sempre pronto para aprender. Que tal dar-lhe um novo desafio hoje?

Paula Perdigão

Neurociência Comportamental e Cognitiva